quarta-feira, novembro 24

A terceira margem do poema


Tem certa época que deixo o tempo

Se engraçar aqui pra dentro de casa

Deixo ele soprar a fuligem dos móveis

Feito moço que veio de longe, galanteador

seduzindo a donzela confiante de suas prendas.

Agora estou me preparando para ele

Peço que me mostre sua forma concreta

Um esboço, um desenho ou um mero rabisco

De como ele é em sua essência,

Pois até hoje só o conheço de nome

Não sei o seu endereço, seu paradeiro, seu telefone

E nem um respingo de expectativa alimento

Pra pelo menos esperar ele fazer um contato

Dizer um “alô” e “me espera no portão tal hora.”

Eu nem tenho como enfeitar meu pescoço

Minhas orelhas e colocar anel de prometimento.

Engomei o vestido de renda e pendurei no guarda roupa

Ele nunca vai ficar amarelo no futuro

Nunca vai ter aquela cor de passado

Eu quero vesti-lo e me dar de presente.

Ainda convivo com os arquétipos da juventude

Tenho todos eles pendurados na prateleira

As esperanças lavadas, os romantismos fresquinhos no vaso de cristal

A imagem da sagrada família que viaja todas as gerações

Dos olhares e devoções.

O mundo com seus passantes

Ainda me comove. Só que ele está lá fora e eu não

O convido para hospedagem.

Nenhuma paisagem externa me demove deste cenário

Que ele mesmo desenhou pra mim

na terceira margem de um poema.





Elisa Carvalho




Um comentário:

Anônimo disse...

mais um poema acertado moça
beijosssssssssssssssss