Tem certa época que deixo o tempo
Se engraçar aqui pra dentro de casa
Deixo ele soprar a fuligem dos móveis
Feito moço que veio de longe, galanteador
seduzindo a donzela confiante de suas prendas.
Agora estou me preparando para ele
Peço que me mostre sua forma concreta
Um esboço, um desenho ou um mero rabisco
De como ele é em sua essência,
Pois até hoje só o conheço de nome
Não sei o seu endereço, seu paradeiro, seu telefone
E nem um respingo de expectativa alimento
Pra pelo menos esperar ele fazer um contato
Dizer um “alô” e “me espera no portão tal hora.”
Eu nem tenho como enfeitar meu pescoço
Minhas orelhas e colocar anel de prometimento.
Engomei o vestido de renda e pendurei no guarda roupa
Ele nunca vai ficar amarelo no futuro
Nunca vai ter aquela cor de passado
Eu quero vesti-lo e me dar de presente.
Ainda convivo com os arquétipos da juventude
Tenho todos eles pendurados na prateleira
As esperanças lavadas, os romantismos fresquinhos no vaso de cristal
A imagem da sagrada família que viaja todas as gerações
Dos olhares e devoções.
O mundo com seus passantes
Ainda me comove. Só que ele está lá fora e eu não
O convido para hospedagem.
Nenhuma paisagem externa me demove deste cenário
Que ele mesmo desenhou pra mim
na terceira margem de um poema.
Elisa Carvalho